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quarta-feira, 18 de março de 2009

Rosa de saron

Um mundo de conhecimento no caçuá do burrinho

os livros mais interessantes, um palhaço se junta aos agentes de leitura para organizar a fila dos livros e explicar a iniciativa aos pais das crianças. Incrédulos e surpresos - no dia do lançamento, quase ninguém da comunidade sabia do que se tratava - eles também se mostram interessados nas leituras ilustradas.O Livros Andantes é um dos projetos aprovados pelo Funcultura, com orçamento disponível para apenas três meses. A cineasta Clara Angélica, natural de Amaraji e idealizadora da iniciativa, compartilha dos sonhos daquelas crianças e pensa longe. "A gente espera que alguém abrace a idéia e ajude a expandir para os demais povoados daqui e de outros mAmaraji - Aos 19 anos, Riana Mércia sonha em entrar para a faculdade de Pedagogia, uma realidade aparentemente distante para a maioria dos seus colegas no povoado de Estivas, na zona rural de Amaraji, a 92 km do Recife. Enquanto o vestibular de julho não chega, ela ajuda outros a sonhar. Desde domingo (15), Riana é peça fundamental de um curioso projeto chamado Livros Andantes. Pendurados no caçuá de um burrinho transformado em biblioteca-móvel, cerca de 100 livros ficam disponíveis para dramatização e empréstimo. Basta deixar o nome e devolver no domingo seguinte.

Foto: Paulo Rebelo/DP/D.A Press

Riana Mércia não é autora da idéia, mal conhece os coordenadores do projeto, mas é uma das professoras da Escola Conceição Barbosa Lima e Silva, antes conhecida como Escola 1º de Agosto. A mesma onde terminou seu ensino básico e fundamental. Hoje, com o apoio da biblioteca-móvel, ela ganha um aliado para incentivar o hábito de leitura em crianças como Raiane, Fabiana, Tiago, Enderson, Edvânia, Rose, Avani e Débora. "O pessoal aqui não gosta muito de ler, mas as crianças na escola sempre perguntam sobre os livros. A biblioteca da gente é tão pequena. Até na cidade (centro de Amaraji) os livros são muito velhos e acabados", explica a jovem.São as crianças as maiores beneficiadas pelo universo da literatura móvel oferecida pelo Livros Andantes. Da escola até o centro de Estivas, a criançada acompanha o burrinho-sem-nome até uma tenda armada pelos agentes de leitura. Logo ali ao lado, há um povoado que atende pelo nome de "Não pensei". E até agora parece que ninguém havia pensado como um simples equino poderia transformar tanto o domingo dessas pessoas. Enquanto escolhem unicípios, usando o transporte mais usado em cada lugar. Hoje é um jumento ou um burrinho, mas pode ser bicicleta, navio, moto, qualquer coisa", diz.Responsável pela coordenação pedagógica, a arte-educadora e atriz Márcia Cruz explica que a proposta, embora inicialmente restrita a apenas dois povoados, vai além do incentivo à leitura. "Queremos melhorar as perspectivas das pessoas daqui, compartilhar experiências, incentivar a oralidade e as expressões de cada uma. Treinamos educadores locais para contar histórias e dramatizar, de modo a não transformar a leitura em algo obrigatório, mas em algo prazeroso", define.No percurso de apenas 100 metros entre a escola e o centro de Estivas, a criançada não esconde a ansiedade. Um palhaço as espera para montar brincadeiras sobre as histórias contadas nos livros. Todo domingo será assim, mas apenas em Estivas, a 15 km do centro de Amaraji; e em Mulungu, a 20 km. Ao final dos três meses programados, os caçuás serão doados às escolas dos dois povoados, dando início a uma biblioteca comunitária.Com a nova biblioteca a partir dos caçuás, garotos como Valter, 6, vão poder ler à vontade toda a coleção de Os seres encantados, por exemplo. São histórias clássicas adaptadas com ilustrações para crianças, em meio a outras coleções de Monteiro Lobato e até Shakespeare, entre outros autores. Próximo domingo, Valter vai devolver A mula sem cabeça em companhia da coleguinha Regina, que preferiu levar Saci Sapeca. No próximo domingo, parte do pequeno exército de novos leitores estará de volta. Provavelmente uniformizados como "soldados de cristo" ou "salvadores de vidas" - trajes vendidos pela Igreja Evangélica do povoado a R$ 8 cada peça - voltando para casa com os livros em mãos e alimentando a esperança de que, ao menos pelos próximos três meses, suas vidas sejam ilustradas por mais literatura e perspectiva de futuro.

Crença no Arrebatamento é colagem de textos bíblicos, dizem especialistas

Tentativa de harmonizar profecias apocalípticas data do século 19.Autores da Bíblia escreveram pensando em seu contexto imediato. Reinaldo José Lopes Do G1, em São Paulo Tamanho da letra A- A+ "Em caso de Arrebatamento, este veículo ficará desgovernado." Adesivos com esses dizeres podem ser vistos nos carros de evangélicos do mundo inteiro, inclusive no Brasil. A ideia é que, no fim dos tempos, os cristãos realmente fervorosos serão arrebatados (daí o nome) de corpo e alma para o céu, enquanto uma série de catástrofes naturais e políticas afetarão a Terra durante sete anos. Ao fim desse período, Jesus voltará como conquistador ao nosso planeta, derrotando o Anticristo numa grande batalha em Israel. Esse cenário épico é inspirado em várias passagens da Bíblia -- mas é preciso forçar consideravelmente a interpretação do texto sagrado para chegar a ele, de acordo com especialistas.

Em essência, a crença no Arrebatamento é uma colagem de trechos do Novo e do Antigo Testamento, cada um deles com perspectivas diferentes sobre o futuro da humanidade e o retorno glorioso de Jesus Cristo à Terra. "É uma tentativa de criar um mapa dos eventos futuros com base, por exemplo, no Apocalipse, no capítulo 13 do Evangelho de Marcos e na Primeira Carta de Paulo aos Tessalonicenses", diz Paulo Augusto Nogueira, professor da pós-graduação em ciências da religião da Universidade Metodista de São Paulo.

De acordo com o americano Thomas Sheehan, estudioso do cristianismo primitivo e professor da Universidade Stanford, a ideia do Arrebatamento é relativamente recente. "Ela foi criada pela primeira vez no começo do século XIX, graças ao trabalho do pregador evangélico John Nelson Darby, e foi se tornando cada vez mais codificada ao longo do século XX, até chegarmos aos cenários detalhados que cristãos conservadores de hoje defendem", diz Sheehan. As chamadas igrejas cristãs históricas, como a Igreja Católica, a Igreja Anglicana e as várias igrejas luteranas, não adotam as mesmas crenças.
Anticristo contra o Rei Jesus
Sheehan resume da seguinte forma o cenário mais popular para os acontecimentos ligados ao Arrebatamento entre os evangélicos americanos. O primeiro evento envolve o surgimento do Anticristo, provavelmente um diplomata de grande prestígio internacional e membro da tribo israelita de Benjamim (um judeu, portanto). O Anticristo faz um acordo de paz com o estado de Israel, permitindo que o Templo judaico, destruído há quase 2.000 anos, seja reconstruído em Jerusalém. Ao mesmo tempo, um dos subordinados do Anticristo, um financista conhecido como o Falso Profeta, cria um sistema -- talvez um cartão magnético -- que unifica o planeta economicamente.

É nesse ponto que ocorreria o Arrebatamento. "Os verdadeiros cristãos - o que exclui católicos, episcopais e outros grupos mais moderados -- são arrebatados para o céu deixando até suas roupas", diz Sheehan. "Quem fica para trás, segundo essa visão, são os chamados cristãos mundanos, ou cristãos formais -- justamente os que não acreditam que o Arrebatamento iria ocorrer. Isso é muito típico da mentalidade sectária: só nós somos os detentores da verdadeira revelação", explica Nogueira.

Logo após os cristãos serem arrebatados, começam cerca de sete anos da chamada Tribulação, em que o mundo todo sofre com guerras, catástrofes naturais e genocídios. Traindo os judeus, o Anticristo coloca uma imagem de si próprio -- a chamada Abominação da Desolação -- no Templo de Jerusalém, profanando o local sagrado. No fim da Tribulação, Jesus volta à Terra montado num cavalo branco, à frente do exército divino, e derrota as forças do Anticristo numa grande batalha perto da localidade israelense de Megiddo -- é daí que vem a expressão "Armageddon", ou seja, "montanha de Megiddo".

"Após essa batalha, Jesus dará aos judeus uma última chance de aceitá-lo como seu Messias. Os que recusarem serão massacrados; os que seguirem Jesus farão parte de seu reino na Terra, uma Era de Ouro de grande prosperidade, saúde e paz, que durará mil anos", diz Sheehan. No fim desse período, o Demônio tentará atacar o reino de Jesus, mas será definitivamente derrotado, e "um novo céu e uma nova Terra" serão criados. Os mortos ressuscitarão e serão julgados de uma vez por todas.
Quebra-cabeças artificial?
Essa linha do tempo detalhadíssima tem dois pressupostos ocultos. O primeiro é que todos os textos bíblicos sobre o fim do mundo funcionam como peças, que têm de ser juntadas pelos cristãos para montar o retrato completo do Apocalipse. O segundo é que os autores bíblicos escreveram suas profecias de olho no futuro distante, prevendo eventos como o ressurgimento de Israel em 1948 ou a invenção dos cartões de crédito.

Ambos os pressupostos provavelmente estão errados. "É importante a gente reconhecer que há vários tipos diferentes de expectativa apocalíptica entre os autores do Novo Testamento", diz Nogueira, que é autor do livro "O que é Apocalipse" (Editora Brasiliense). "O único a realmente falar numa espécie de arrebatamento é Paulo, na Primeira Carta aos Tessalonicenses", afirma. Nas cartas realmente escritas pelo apóstolo Paulo (várias das que estão no Novo Testamento parecem não ser de autoria dele), o líder cristão não fala da Tribulação ou da batalha em Megiddo, mas parece ver o retorno de Cristo de forma simultânea com a ressurreição dos mortos e o arrebatamento dos fiéis ainda vivos.

"Já no Apocalipse, parece claro que os fiéis cristãos não são levados para o céu, mas passam por toda a Tribulação aqui mesmo na Terra", explica o especialista brasileiro. "E existem algumas tradições no Novo Testamento, como o Evangelho de João, que parecem não se preocupar com esses cenários apocalípticos. João fala diretamente em vida eterna para o fiel, sem uma perspectiva clara do retorno de Jesus."

Outro ponto importante é que as profecias cristãs, em especial as do livro do Apocalipse, têm relação direta com a realidade de perseguição que os fiéis do século I estavam enfrentando. É quase certo, por exemplo, que o misterioso número 666, associado ao Anticristo, seja apenas uma representação do imperador romano Nero, supostamente responsável por executar Pedro e Paulo entre os anos 64 e 67 de nossa era. Nos alfabetos hebraico, aramaico e grego, cada letra tinha um valor numérico, e a soma das letras do nome "Nero César" poderia chegar a esse valor, dependendo de como a conta é feita.

Também são feitas referências às sete colinas da cidade de Roma, entre outros elementos do império inimigo dos primeiros cristãos. Para Nogueira, todo o cenário de guerra que circunda o livro do Apocalipse indica que ele provavelmente foi escrito por cristãos de origem judaica, cuja comunidade ficou traumatizada com a destruição de Jerusalém pelos romanos no ano 70. "Quem não vê esse contexto imediato da narrativa desconsidera o primeiro leitor desses livros", resume ele.
Visão literal
Isso não quer dizer, porém, que os primeiros cristãos entendessem suas próprias esperanças apocalípticas de forma alegórica ou simbólica. "Em parte, a linguagem do Apocalipse é a do êxtase profético, mas eu não duvido muito que eles fizessem uma leitura literal dele. Até porque o livro coloca tudo em termos radicais -- ele não admite uma postura neutra", diz Nogueira.

Como, então, os cristãos modernos deveriam encarar as profecias apocalípticas sem cometer erros de interpretação nem anacronismos? "Essa é a grande questão", reconhece Nogueira. "Acho que podemos vê-las como a resposta de irmãos de fé diante da perseguição. E também como uma mensagem de esperança, que pode ter uma força muito grande." Seja como for, não custa nada levar em consideração a advertência do próprio Jesus, no Evangelho de Marcos, a respeito de quem deseja prever com exatidão o fim do mundo: "Mas daquele dia e hora ninguém sabe, nem os anjos que estão no céu, nem o Filho, senão o Pai".